domingo, 9 de maio de 2010


Encontro em Olhão

No âmbito da iniciativa Encontros nos Concelhos, realizámos, em 17 de Abril, uma visita a Olhão. Guiadas pela Cândida Cativo, visitámos os pontos de maior interesse no centro urbano, como a igreja de Nossa Senhora do Rosário, o Museu Municipal e os bairros típicos do Levante e da Barreta, com as suas ruelas apertadas, com nomes sugestivos como Travessa dos Abraços ou a dos Sete Cotovelos. Mas a melhor perspectiva deste casario de características tão invulgares e que trouxe o epíteto de Vila Cubista a Olhão é do alto da Torre da Igreja do Rosário, a que também subimos. Estas construções com “soteia” e, às vezes, com mirante e até contra-mirante, são o produto de influências que não tinham sido deixadas pelos árabes, mas que foram trazidas, mais tarde, por comerciantes e emigrantes regressados de Marrocos.

Uma passagem pela zona dos mercados municipais numa manhã de Sábado permitiu-nos usufruir não só da beleza da paisagem ribeirinha, mas também do movimentado mercado ao ar livre, cheio de cores e de aromas.

A Biblioteca Municipal foi um dos pontos altos da visita, e aí pudemos apreciar a modernidade do equipamento, assim como o dinamismo da sua Direcção.

O almoço foi uma oportunidade para convívio agradável e para saborear as especialidades gastronómicas da cidade.

Não sendo Olhão uma cidade particularmente rica em monumentos, tem a sua maior riqueza nas suas gentes. Ao longo da visita, o povo olhanense foi-se impondo como uma presença constante e valorosa. Homens corajosos como os que atravessaram o Atlântico em 1808 para dar a boa nova ao Rei então exilado no Brasil, e que com esse feito conseguiram a elevação da aldeia a Nobre Vila de Olhão da Restauração.

Homens de grande coração como o Patrão Joaquim Lopes que tantas vidas salvou; figuras importantes nas lutas republicanas; artistas de mérito. Ou figuras anónimas que com o seu trabalho e empenhamento criaram o Compromisso Marítimo ou construíram a Igreja Matriz em cuja torre do sino pode ler-se a inscrição:

“À custa dos homens do mar deste povo se fez este templo novo, no tempo em que só havia umas palhotas em que viviam”.






PALÁCIO e PARQUE de MONSERRATE

O Parque de Monserrate constitui um dos mais notáveis exemplos de jardins românticos em Portugal, fruto das contribuições dos seus proprietários e arrendatários que, desde os finais do século XVIII, o foram enriquecendo sucessivamente

Da história do local sabe-se que em 1540, Monserrate, então designado como Quinta da Bela Vista, estava integrado nos domínios do Hospital de Todos os Santos, de Lisboa. Frei Gaspar Preto, após uma peregrinação ao Eremitério Beneditino de Montserrat, na Catalunha, terá mandado edificar uma capela dedicada a Nossa Senhora de Monserrate, presumivelmente no local onde, segundo a lenda, durante o domínio árabe, um cavaleiro moçárabe, que ali vivia em conflito com o alcaide do Castelo dos Mouros, acabaria por perecer. Sepultado na colina seria posteriormente, venerado como mártir.

Em 1601, o Hospital de Todos os Santos aforava Monserrate à família Mello e Castro. D. Caetano de Mello e Castro, comendador de Cristo e vice-rei da Índia, acabaria por comprar a propriedade em 1718. Das casas então existentes, apenas se sabe que o Terramoto de 1755 as tornou inabitáveis.

Em 1790, Gerard DeVisme, comerciante inglês que enriquecera graças ao monopólio da importação de pau-brasil, concedido pelo marquês de Pombal, arrenda a quinta de Monserrate e manda construir um palacete neogótico. DeVisme residiu pouco tempo em Monserrate, acabando por subarrendar a propriedade e todas as suas benfeitorias a William Beckford, por volta de 1794.

Beckford utilizou uma pequena parte da sua grande fortuna para realizar inúmeras benfeitorias no palácio. Avançou, também, com a primeira concretização de um jardim romântico, que integrava as ruínas, um Cromeleque e uma cascata natural ali existentes.

Em 1799, Beckford deixa definitivamente o nosso país e Monserrate volta a entrar em declínio. Em 1809, Monserrate é visitada por Lord Byron, o famoso poeta, que cantou a beleza deste local na sua obra Childe Harold's Pilgrimage. O poeta, referindo-se ao palácio lamenta que "um matagal enorme" a custo lhe permitisse chegar "às salas sem ninguém com seus portais abertos" e considera, em carta escrita a 16 de Junho desse ano, que a Quinta de Monserrate "o primeiro e mais lindo lugar deste reino".

Em 1856 a quinta de Monserrate é comprada à família Mello e Castro por Francis Cook, um milionário inglês, comerciante de têxteis que manda refazer o palácio, agora ao gosto neo-mourisco, e que cria um notável jardim paisagístico, inspirado pelo romantismo inglês.

É graças ao espírito romântico de Francis Cook, à intervenção programática do paisagista William Stockdale, do botânico William Nevill e do mestre jardineiro James Burt que podemos hoje encontrar cenários contrastantes no Parque de Monserrate que, ao longo de caminhos sinuosos, por entre ruínas, recantos, lagos e cascatas nos permitem o contacto com ancestrais Fetos-arbóreos e Araucárias da Nova Zelândia e da Austrália, Agaves e Palmeiras que recriam um cenário do México, camélias, azáleas, rododendros e bambus, lembrando um jardim do Japão. Nesta aparente desordem, exemplares de espécies espontâneas da região, como os surpreendentes Medronheiros de porte

arbóreo, os já muito raros Azevinhos e os imponentes Sobreiros pontuam e complementam a magnífica paisagem.

Os jardins demoraram bastante tempo até serem concluídos (1863 a 1929). Monserrate manteve-se na posse da família Cook até 1947.

Monserrate oferece-nos hoje a possibilidade de fruição de um ambiente característico de um jardim romântico à inglesa, para além da contemplação de um património arquitectónico de referência e o conhecimento de inúmeras espécies botânicas de grande notoriedade

QUINTAS DE SINTRA – Março 2010

Dando continuidade ao nosso projecto Descobrir Paraísos na Cidade, iniciado na Primavera passada com os Jardins da Andaluzia e Pátios de Córdoba, seguindo-se as Quintas Românticas do Porto, visitamos agora as Quintas de Sintra.

No seu conjunto, Sintra foi classificada em 1995 como Património Mundial, na categoria de Paisagem Cultural,

o que pressupõe a existência de uma mistura harmoniosa

e “excepcional de sítios naturais e culturais num quadro exemplar”.

Do vasto património cultural, seleccionámos para esta visita o Parque de Monserrate e a Quinta da Regaleira.

O primeiro, por ser o expoente máximo do jardim romântico em Portugal, pela exuberância e exotismo da

sua flora e pelo efeito cénico dos seus elementos.

A Quinta da Regaleira, por constituir um curioso e raro exemplar (embora relativamente recente) dos jardins de tradição iniciática que apareceram em vários lugares da

Europa, a partir do Renascimento.

Quinta da Regaleira

“ Situada em pleno Centro Histórico de Sintra, a Quinta da Regaleira é um lugar com espírito próprio. Edificado nos primórdios do Século XX, este fascinante conjunto de construções, nascendo no meio da floresta luxuriante, é o resultado da concretização dos sonhos mito-mágicos do seu proprietário, António Augusto Carvalho Monteiro (1848-1920), aliados ao talento do arquitecto-cenógrafo italiano Luigi Manini (1848-1936). 


A imaginação destas duas personalidades invulgares concebeu, por um lado, o somatório revivalista das mais variadas correntes artísticas - com particular destaque para o gótico, o manuelino e a renascença - e, por outro, a glorificação da história nacional influenciada pelas tradições míticas e esotéricas.

A Quinta da Regaleira é um lugar para se sentir. Não basta contar-lhe a memória, a paisagem, os mistérios. Torna-se necessário conhecê-la, contemplar a cenografia dos jardins e das edificações, admirar o Palácio dos Milhões, verdadeira mansão filosofal de inspiração alquímica, percorrer o parque exótico (….)

A culminar a visita à Quinta da Regaleira, há que invocar a aventura dos cavaleiros Templários, ou os ideais dos mestres da maçonaria, para descer ao monumental poço iniciático por uma imensa escadaria em espiral. E, lá no fundo com os pés assentes numa estrela de oito pontas, é como se estivéssemos no ventre da Terra-Mãe. Depois, só nos resta atravessar as trevas das grutas labirínticas, até ganharmos a luz, reflectida em lagos surpreendentes.”

Da página da cultura da C.M. de Sintra

terça-feira, 30 de março de 2010

Cacela Velha




Na visita ao Concelho de Vila Real de Sto. António, passámos por Cacela Velha.
Embora o estado do tempo não nos tivesse permitido trazer imagens soalheiras como a da fotografia publicada, aqui fica o registo de outras andanças.
Fica também uma nota sobre um poeta e sobre o livro que sobre ele se escreveu, Ibn Darraj al-Qastalli cuja história se liga à história de Cacela e que nos foi apresentado no local por Hugo Cavaco, um especialista em história do Algarve que tivemos o privilégio de ter como guia.

As transcrições que se seguem são do livro Cacela e o seu Poeta-Ibn Darraj al-Qastalli na História e Literatura do Al-Andalus, de Ahmed Tahiri e da respectiva Apresentação, de José Carlos Barros, que a Câmara de VRSA teve a amabilidade de nos oferecer, juntamente com outras publicações relacionadas com o Concelho (algumas da autoria de Hugo Cavaco) e que podem ser consultadas na Biblioteca da nossa Associação.

Ibn Darraj al-Castalli nasceu em Cacela em meados do século X e foi considerado, em todo o al-Andalus, o maior poeta do seu tempo.
Do trabalho de investigação feita recentemente por Ahmed Tahid resultou o referido livro.
Seguindo uma metodologia de " arqueologia textual" como afirma o seu autor, ficou a saber-se mais sobre a poesia cultivada no al-Andalus e também sobre a história de Cacela:

"Cacela, ou Castalla, tinha para o Algarve Oriental a mesma importância de Silves para o Algarve Extremo; e só agora, de ciência certa, compreendemos que Cacela, na sequência do declínio que afectou a cidade de Santa Maria, chegou a ser a segunda cidade mais importante do Algarve."

" Não pode deixar de considerar-se excepcional que, através da poesia, e com o seu pretexto, a História se acrescente e se desenhe na sua dimensão inteira."

" Sabemos (e compreendemos) hoje melhor, depois deste livro, que além do património, da arquitectura, da paisagem, das hortas e dos campos de figueiras, da luz da Ria poisada nas paredes de cal - Cacela é sobretudo uma realidade urbana (e intangível) feita de poesia e milagre."

Poema 31


Tive, em vez de uma longa vida de doçura,
A travessia de vales e montes lamacentos,
Em vez de noites breves sob os véus
O temor da viagem no seio de infindável treva;
Em vez de água límpida sob sombras
O fogo das entranhas queimadas pela sede;
Em vez do perfume errante das flores
O hálito esbraseado do meio-dia;
Em vez da intimidade entre dama e amiga
A rota nocturna cercado de lobos e de génios
Em vez do espectáculo de um rosto gracioso
Desgraças suportadas com nobre constância.

Ibn Darraj al-Qastalli

terça-feira, 9 de março de 2010

Alentejo - Novembro 2009



Este velho hábito de deambular por aí, à procura de lugares que nos surpreendam (não tanto pela novidade em si, mas por renovados pontos de vista com que os observamos), levou-nos, desta vez, ao Nordeste Alentejano.
Embora o tempo se apresentasse mais para o chuvoso, o sol, de quando em vez, aparecia para iluminar, oblíquo, esplêndidas paisagens outonais. Uma festa para os olhos, estes bosques de freixos, carvalhos e castanheiros. Dominam os amarelos e avermelhados, espaçados por muitas outras gamas de cores.
À medida que vamos entrando no coração da Serra de S. Mamede, as ondulações suaves de montado ora se afundam em vales viçosos, ora se erguem em penhascos agrestes.
Aproximando-nos de Portalegre, impossível não lembrar José Régio e a sua “toada”, muito bem lida pela Fernanda Pinguinha (depois de um pequeno incidente que não vem ao caso):

Em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros
(…)


Nesta cidade, optámos por uma visita ao Museu de Tapeçaria Guy Fino. É inacreditável a perfeição e riqueza cromática do ponto de Portalegre! Mas é talvez esta a explicação para a quantidade de artistas notáveis (nacionais e estrangeiros) que têm assinado obras para esta manufactura.
De Castelo de Vide fica a imagem do casario branco galgando as encostas do castelo, das expressivas texturas da cal, das inúmeras portas góticas. Não fosse Outono e as fachadas ostentariam risonhos vasos de flores. Fica o mistério de ruelas sinuosas que escondem segredos, memórias judaicas. São histórias de Inquisição mas também são histórias de tolerância. A Fonte da Vila lá está ainda, fonte de vida e símbolo de boa convivência entre judeus e cristãos.
Finalmente, Marvão. Dita inexpugnável, lá no cimo da escarpa, constitui um conjunto de fortalezas que se foram sobrepondo para responder a novas necessidades defensivas. Dir-se-ia que lá no alto só encontraríamos o vento e a rocha… Na verdade, o que nos esperava era uma vila em festa, o grande magusto que ali se realiza todos os anos.
O vento forte eleva o fumo das castanhas assadas, mistura os cheiros dos petiscos, as vozes, os sons dos inúmeros grupos musicais que percorrem as ruas. Fica saborosa, a vila! Habitualmente é habitada apenas pelo silêncio recolhido das suas memórias.
Vista do interior, Marvão surpreende pelo aconchego do casario, de um branco irrepreensível, pela beleza de recantos e pormenores arquitectónicos, pela força protectora das suas muralhas.
Subimos à torre: a lonjura a perder-se na bruma lembra-nos episódios de vida de fronteira, histórias de contrabando. Tempos difíceis esses, em que este era o sustento de muitas famílias.
“O tempo mora aqui”. Nós é que não…Temos de regressar.
Mas trazemos a memória povoada de cores, sons, sabores e risos (muitos!).